Estranhezas do Cálculo Fracionário

O Cálculo Fracionário é um área de estudo ‘nova’ e tudo que sabemos sobre o cálculo de ordem inteira tem que ser revisto!

Por exemplo, no cálculo de ordem inteira o mínimo de uma função é dado pela condição $df(x)/dx=0$. Sendo assim para a função $f(x)=(x-c)^2$ o mínimo é facilmente encontrado fazendo $df(x)/dx=2(x-c)=0$, i.e, $x=c$. Isto significa que qualquer ponto na proximidade de $c$, i.e. $c\pm h$, resulta em $f(c\pm h)>f(c)$.

Veja que a condição $d^qf(x)/dx^q=0$ fornece um resultado bem diferente dependendo da ordem $q$. Considerando que $f(x)=(x-c)^2=x^2-2xc+c^2$ teremos

$d^qf(x)/dx^q=\frac{d^q}{dx^q}x^2-2c\frac{d^q}{dx^q}x+c^2\frac{d^q}{dx^q}1=0$

$d^qf(x)/dx^q=\frac{\Gamma(3)}{\Gamma(3-q)}x^{2-q}-2c\frac{\Gamma(2)}{\Gamma(2-q)}x^{1-q}+c^2\frac{\Gamma(1)}{\Gamma(1-q)}x^{-q}=0$ 

$d^qf(x)/dx^q=x^{-q}\left(\frac{\Gamma(3)}{\Gamma(3-q)}x^{2}-2c\frac{\Gamma(2)}{\Gamma(2-q)}x+c^2\frac{\Gamma(1)}{\Gamma(1-q)}\right)=0$

logo, $x=0$ é uma solução, além das raízes da equação

$\frac{2}{\Gamma(3-q)}x^{2}-2c\frac{1}{\Gamma(2-q)}x+c^2\frac{1}{\Gamma(1-q)}=0$

Obviamente que $c$ não é uma solução para qualquer $q$, pois implicaria na veracidade da relação

$\frac{2}{\Gamma(3-q)}-\frac{2}{\Gamma(2-q)}+\frac{1}{\Gamma(1-q)}=0$

para qualquer $q$. Se $q=1$ temos de fato

$\frac{2}{\Gamma(2)}-\frac{2}{\Gamma(1)}+\frac{1}{\Gamma(0)}=2-2+0=0$

mas para qualquer outro $q$, as raízes são diferentes de $c$, como mostrado na Figura seguinte. Portanto, a condição $d^qf(x)/dx^q=0$ não fornece os valores de $x$ que minimizam a função $f(x)$.

d=3;
i=1;
for q=.1:.1:1

a=2/gamma(3-q);
b=-2*d/gamma(2-q);
c=d^2/gamma(1-q);

delta=b^2-4*a*c;
qx(i)=q;
x1(i)=(-b+sqrt(delta))/(2*a);
x2(i)=(-b-sqrt(delta))/(2*a);
i=i+1;
end
[qx' x1' x2']
figure
plot(qx,x1,'k-',qx,x2,'k:')
xlabel('\alpha')

No cálculo de ordem inteira definimos uma função crescente, no intervalo $[x,x+L]$, tal que $y(x+h)>y(x)$ com $0<h<L$, para tal vale a condição que $dy/dx>0$ neste intervalo.  Veja que tal correlação se perde em relação a quantidade $d^qf(x)/dx^q$, como podemos observar na Figura seguinte para $q=0.5$. Na figura seguinte a linha contínua representa a função $(1-x)^2$ e a linha pontinha sua derivada de ordem $0,5$, neste caso não existe uma relação entre o fato da função ser crescente ou decrescente, em um determinado $[x,x+L]$, com o sinal da função $d^qf(x)/dx^q$ neste intervalo.

d=3;
x=0:.05:6;
y=(x-d).^2;
q=.5;
a=2/gamma(3-q);
b=-2*d/gamma(2-q);
c=d^2/gamma(1-q);
dyq=a*x.^2+b*x+c;
figure
plot(x,y,'k-',x,dyq,'k:',x,2*(x-d),'k-.')
xlabel('x')

Outro resultado bastante curioso é encontrado para o caso em que $n=0$ na equação da deriva, i.e.,

$\frac{d^{1/2} t^0}{dt^{1/2}}=\frac{\Gamma(0+1)}{\Gamma(0-1/2+1)}t^{0-/2}=\frac{\Gamma(1)}{\Gamma(1/2)}t^{-1/2}=\frac{1}{\sqrt{\pi}}t^{-1/2}$

Quando $n=0$, temos a função $t^0$, que é igual a $1$ para todo $t$. Portanto, $t^0$ é uma constante. A equação acima mostra que a derivada de ordem $1/2$ de uma constante tem um valor diferente de zero. No cálculo de ordem inteira a deriva de qualquer ordem de uma constante é zero.

Questões como esta e outras foram motivos de muita controvérsia ao longo do desenvolvimento do Cálculo Fracionário, o que afastou muitos pesquisadores desta linha. Atualmente estes pontos são melhor compreendidos.